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# O uso do astrolábio caseiro no <br />ensino da trigonometria
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$$\newcommand{\sen}{\mathrm{sen}\thinspace}\newcommand{\tg}{\mathrm{tg}\thinspace}$$
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::: autores
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Bruna Eduarda Unser^[1](#footnote-23){#footnote-ref-23}^ <br />
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Eduardo Rossoni Zeni^[2](#footnote-24){#footnote-ref-24}^ <br />
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Fabiana Magda Garcia Papani^[3](#footnote-25){#footnote-ref-25}^
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## Objetivo geral
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Esta proposta didática propõe a construção de um astrolábio caseiro e a
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utilização desse instrumento para realização de um experimento de
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medições, simulando o trabalho, por exemplo, de geógrafos, agrimensores
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ou astrônomos. Os resultados obtidos nessas medições serão utilizados
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para ensinar trigonometria. A proposta também prevê a inserção do uso de
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planilhas eletrônicas como ferramenta para o ensino de trigonometria.
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## Introdução
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A trigonometria (TRI + GONO + METRIA que significa TRÊS + ÂNGULOS +
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MEDIDA), é "\[\...\] parte da matemática que tem como objeto de estudo
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os lados e os ângulos de um triângulo" [@leite_2016, p. 15]. Surgiu com
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as necessidades práticas oriundas da astronomia, agrimensura, navegação,
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entre outras ciências. Para solucionar problemas, como por exemplo,
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calcular as alturas das pirâmides ou a largura dos rios, os
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cientistas^[4](#footnote-26){#footnote-ref-26}^ dessas áreas se baseavam
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em dois conceitos matemáticos básicos: a razão entre dois números e
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semelhança de triângulos.
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Segundo Boyer [@boyer_2001], a trigonometria não foi obra de um só homem, nem
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de um só povo, e seus primeiros indícios apareceram no Egito e na
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Babilônia. No Egito, rudimentos de trigonometria aparecem a partir da
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revolução agrícola, quando o homem começou a demarcar terras, fixar
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propriedade e formas de plantio, gerando a necessidade de saber qual o
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tamanho do terreno, por exemplo. Na Babilônia, além da agricultura, a
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evolução da trigonometria se deu pelo trabalho dos astrônomos, que
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durante muitos anos mediram os movimentos dos astros.
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O astrolábio, cuja origem do nome provém do grego *astrolabion*, foi um
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instrumento desenvolvido e aprimorado durante séculos por diversos povos
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com base em teorias aritméticas, trigonométricas, astrológicas e
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geográficas. Quando do seu surgimento, tinha como função resolver
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problemas relacionados à navegação, ao deslocamento e temporalidade dos
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astros, a medir a altura de objetos de difícil acesso, entre outras
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aplicações.
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Autores discutem sobre o surgimento exato ou até mesmo a inexistência de
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uma história completamente linear e definida de tal instrumento. No
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entanto, sua presença em diversas culturas e regiões distantes umas das
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outras demonstra seu movimento, utilização, bem como seu papel
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científico e social. No contexto islâmico, por exemplo, o indivíduo que
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sabia utilizar o astrolábio era considerado uma pessoa importante e
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possuir um astrolábio era sinal de poder político e religioso [@saraiva_2016].
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{#fig-41 fig-alt="Astrolábio Esférico" loading="lazy"}
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[Fonte:]{.figure-caption} @brian
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Com o passar dos anos, os instrumentos criados pelos antepassados foram
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sofrendo melhorias em seus mecanismos, se adequando às necessidades e
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isso não foi diferente com o astrolábio. O instrumento passou por
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diversas versões até chegar no que temos hoje. Podemos ver, na [[@fig-41]]{.nobreak}, o
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astrolábio esférico. Este possuía discos, nos quais pontuavam-se as
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latitudes, longitudes, horizonte, mapa astrológico e movimento do sol.
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Esses adornos possibilitavam a descoberta de características do tempo e
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do espaço, tais como dias, estações e partilhas geográficas durante todo
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o ano. Devido às mudanças de contextos históricos e de realidade e,
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ainda, pelo fato deste instrumento ser muito pesado e complexo,
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dificultando seu uso, este astrolábio caiu em desuso, sendo substituído
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por uma versão mais leve e simplificada, baseada na projeção
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estereográfica. O astrolábio planisférico, o qual podemos observar na
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[@fig-42], é capaz de resolver problemas sem precisar recorrer à
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trigonometria esférica. Nos séculos XV e XVI, o astrolábio plano foi
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simplificado dando origem ao astrolábio náutico, o qual foi amplamente
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utilizado no continente europeu [@fantuzzi]. Veja [@fig-43]. A
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invenção do relógio de pêndulos e de instrumentos científicos como o
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telescópio fez do astrolábio um instrumento obsoleto e atualmente
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astrolábios são construídos apenas por curiosidade, diversão ou para
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fins educacionais [@morrison].
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{#fig-42 fig-alt="Astrolábio Planisférico" loading="lazy"}
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[Fonte:]{.figure-caption} [@sailko]
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{#fig-43 fig-alt="Astrolábio Náutico" loading="lazy"}
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Fonte: [@skoklosters]
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Essa proposta didática abordará a construção de uma versão caseira do
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astrolábio e a realização de experimentos com a sua utilização para
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ensinar trigonometria. Vários autores relatam que atividades práticas em
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sala de aula, utilizando o astrolábio, têm trazido bons resultados para
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uma aprendizagem com significado da trigonometria. Campos [-@campos_2017], por
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exemplo, apresenta um relato de experiência, no qual constrói o
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astrolábio e o utiliza em atividades práticas com o objetivo de estudar
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conceitos de razões trigonométricas com alunos do 1º ano do Ensino
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Médio. O autor conclui que a abordagem teórica tradicional aliada às
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atividades práticas contribui para que o aluno perceba a matemática na
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sua vida e não apenas nos livros ou na escola. Soriano, Silva e
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Damasceno [@soriano] colocam que a ressignificação de conteúdos obsoletos,
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por meio da utilização da história da matemática em sala de aula,
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instiga a curiosidade dos alunos e mostra o processo de criação dos
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conceitos matemáticos. Saito [-@saito_2016] salienta que quando o professor
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reintegra o conteúdo matemático ao processo histórico, ele consegue
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propor novas estratégias de ensino, dando outro significado à
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matemática, mostrando que a matemática é uma construção humana, que
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ocorreu aos poucos, com erros, aproximações e, então, pequenos acertos,
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desconstruindo a visão de uma ciência construída por formas
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adivinhatórias completas e por poucos homens sábios.
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Além disso, ao utilizar o astrolábio para realizar medições,
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trabalharemos com a experimentação em sala de aula. Segundo Lorenzato [2010 *apud* @almeida_2019], "experimentar é valorizar também a construção do conhecimento em vez do resultado dele, pois mais
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importante que conhecer a solução é saber como encontrá-la. Tal aspecto
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desperta o interesse do discente e favorece a aprendizagem com
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significado".
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As atividades de experimentação sugeridas nessa proposta didática estão
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propositalmente organizadas de forma a aumentar o grau de dificuldade do
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conteúdo abordado e permitir o avanço dos conteúdos da trigonometria,
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até que em um determinado momento, é introduzida a utilização de
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planilhas eletrônicas como ferramenta facilitadora do ensino desse
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conteúdo. De acordo com Silva e Moraes [-@silva_2016], as planilhas eletrônicas
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se relacionam bem com a matemática e estão repletas de ferramentas que
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proporcionam uma aula bastante dinâmica e atrativa, deixando os alunos
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mais interessados pela disciplina e, consequentemente, alcançando o
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resultado esperado. Saldanha [-@saldanha_2016] ressalta que as atividades
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utilizando planilhas eletrônicas, além de tornar as aulas mais
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atrativas, permitem que os alunos se concentrem no raciocínio e na
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programação, ao invés de efetuar cálculos muitas vezes entediantes.
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## Atividade 1: <br />construção do astrolábio caseiro
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Pretendemos --- com a construção do astrolábio --- desenvolver a
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criatividade, a interatividade entre os alunos e o professor e promover
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o interesse pela história por trás do objeto construído e pelo estudo da
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trigonometria.
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### Materiais e métodos
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A construção do astrolábio requer os seguintes materiais: um canudo ou
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tubo de caneta; um pedaço de arame; fio de *nylon* ou barbante; um
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transferidor; fita adesiva e um objeto que sirva de peso, como metal ou
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uma pedra. Observem a [@fig-44].
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{#fig-44 fig-alt="Materiais para a construção: canudo, tubo de caneta, pedaço de arame,
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barbante, transferidor, fita adesiva e um pedaço de
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metal." loading="lazy"}
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Para construir o astrolábio, deve-se --- com um alicate ou algum objeto
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similar --- segurar o arame, aquecê-lo e fazer um furo no centro do
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transferidor, ou seja, sobre a reta com a marcação de 90°, como
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apresentado na [@fig-45]. Em seguida, é necessário cortar e amarrar um
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pedaço de barbante no furo realizado e amarrar na outra extremidade do
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barbante o objeto escolhido como peso. Por fim, deve-se fixar o canudo
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sobre o transferidor, paralelo à reta que contém as marcações 0° e 180º,
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observe a [@fig-46].
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{#fig-45 fig-alt="Furando o transferidor" loading="lazy"}
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{#fig-46 fig-alt="Canudo fixado nas marcações 0º e 180º" loading="lazy"}
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## Atividade 2: <br />medições com o astrolábio
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### Método de uso
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O objetivo é utilizar o astrolábio construído para realizar medições de
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alturas inacessíveis, simulando o trabalho de um topógrafo, por exemplo,
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e utilizar a dinâmica para a facilitar a compreensão dos conceitos de
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trigonometria, tais como: seno, cosseno e tangente de ângulos notáveis;
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relações trigonométricas em um triângulo retângulo; adição e subtração
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de arcos; apresentar aplicações desses conceitos matemáticos em outras
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ciências e no nosso cotidiano, mostrando que a matemática, assim como
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outras ciências, é desenvolvida pouco a pouco.
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O primeiro passo para utilizar o astrolábio é definir o objeto de
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estudo. Tendo realizado a escolha, deve-se enxergar pelo canudo o topo
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do objeto escolhido como ilustrado na [@fig-47].
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{#fig-47 fig-alt="Modo de usar o astrolábio caseiro. Uma pessoa ao ar livre, em um gramado, usando o astrolábio caseiro para medir um prédio" loading="lazy"}
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Em seguida, deve-se observar o ângulo demarcado pelo astrolábio, o qual
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chamaremos de α (*alfa*). Para isso, basta verificar a marcação
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determinada pelo barbante sobre o transferidor.
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{#fig-48 fig-alt="Uma imagem contendo pessoa, edifício, ao ar livre, usando o astrolábio caseiro para medir." loading="lazy"}
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:::
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Se chamarmos de θ (*teta*) o ângulo complementar ao ângulo *α*, ou seja,
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o ângulo que somado a *α* resulta em 90° ([@fig-48]), podemos observar na
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[[@fig-49]]{.nobreak} que o cateto oposto a *θ* é $h$ (a altura do objeto menos a
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altura do observador) e que o cateto adjacente a este mesmo ângulo é a
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distância $(d)$ entre o observador e o objeto. Assim, devemos também
|
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medir a altura do observador e a distância entre o mesmo e o objeto
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escolhido para estudo.
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{#fig-49 fig-alt="Esquema gráfico da medição, mostrando alfa, teta, a altura do
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observador, a altura do objeto e a distância do observador até o objeto." loading="lazy"}
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Desta forma, a altura do objeto é obtida por meio da aplicação da
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relação ([-@eq-tg]) abaixo, relação métrica no triângulo retângulo baseada na
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tangente do ângulo *θ* e, portanto, relaciona os catetos oposto e
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adjacente a este ângulo.
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$$\tg\theta = \frac{h}{d}$${#eq-tg}
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Considere $h$ a altura do objeto menos a altura do observador e $d$
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é a distância entre o observador e o objeto.
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Uma vez que conhecemos o ângulo θ, a altura do observador e a distância
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entre o observador e o objeto, temos na relação dois elementos
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conhecidos e apenas a altura do objeto desconhecida.
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### Medindo uma árvore
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Para calcular a altura da árvore, seguimos os passos definidos
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anteriormente. Primeiramente, tomou-se a distância da árvore ao observador e com a
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utilização do astrolábio demarcou-se o ângulo *α* --- formado entre o
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canudo e o barbante --- e calculou-se o ângulo complementar $\theta$.
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Em seguida, com uma trena, mediu-se a distância entre a árvore e o
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observador e a altura do observador.
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::: bloco-imagem
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{#fig-410 fig-alt="Imagem ao ar livre com um gramado, um prédio, uma árvore e uma pessoa
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usando o astrolábio caseiro para medir a altura da árvore. Sobre a
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imagem há marcações em vermelho mostrando as medidas obtidas: os ângulos
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alfa e teta, a altura do observador e a distância do observador até a
|
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árvore. A altura da árvore desde a cabeça do observador até o topo é uma
|
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linha pontilhada." loading="lazy"}
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:::
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Nesse exemplo, como exibido na [@fig-410], os resultados obtidos foram,
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$\alpha = 60^\circ$ e consequentemente $\theta = 30^\circ$, a
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distância entre o observador e a árvore foi de $8,35 \thinspace m$ e
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a altura do observador $1,60 \thinspace m$.
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Ao término das medições, os alunos voltam à sala de aula e o professor
|
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utiliza os resultados das observações para introduzir ou aplicar
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conceitos de trigonometria.
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Podemos observar que nesta primeira situação o ângulo $\theta$ é o
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ângulo notável, de $30^\circ$, cuja tangente mede
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$\frac{\sqrt{3}}{3}$. Os ângulos $30^\circ$, $45^\circ$ e
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$60^\circ$ são chamados ângulos notáveis por suas aparições em
|
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vários problemas matemáticos e, assim, é importante conhecer os valores
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do seno, cosseno e tangente desses ângulos. Desta forma, utilizando a
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relação (1), temos que,
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$$\tg30^\circ =\frac{h}{8,35}$$
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Utilizando $0,5773$ como valor aproximado para tangente de $30^\circ$ e realizando as
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devidas manipulações, temos que,
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$$h = 0,5773 \cdot 8,35 = 4,82 \thinspace m$$
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Para sabermos a altura da árvore, basta somarmos o valor encontrado com
|
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a altura do observador, deste modo,
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Altura da árvore = $4,82 + 1,60 = 6,42 \thinspace m$
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### Medindo uma porta
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O objetivo deste experimento é:
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::: bloco-imagem
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{#fig-411 fig-alt="Uma menina usando o astrolábio caseiro para medir uma porta. É uma
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área aberta, mas coberta e com sombra." loading="lazy"}
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:::
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- Medir um objeto acessível, para poder comparar o resultado da medida
|
||
utilizando o astrolábio com a medida obtida em uma medição
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convencional. Escolhemos para isso uma porta, como mostra a [[@fig-411]]{.nobreak}.
|
||
- Provocar uma situação didática na qual o ângulo $\theta$ não é um ângulo
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||
notável, de modo a dar continuidade, em sala de aula, ao ensino da
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||
trigonometria, apresentando algumas relações trigonométricas.
|
||
Realizamos o procedimento de medição como anteriormente, no caso da
|
||
árvore. Obtivemos para este objeto as medidas: $2,60 \thinspace m$ de distância do observador à porta, o ângulo demarcado no astrolábio foi $75^\circ$ e, portanto, seu ângulo complementar é $15^\circ$. Neste caso o ângulo encontrado não é um ângulo notável, mas pode ser obtido como a diferença entre dois ângulos
|
||
notáveis. Sendo assim, podemos calcular sua tangente utilizando a
|
||
relação entre a tangente da diferença e a tangente dos arcos, a
|
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saber:
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$$\tg(a-b) = \frac{\tg a -\tg b}{1+\tg a \cdot \tg b}$${#eq-tgdif}
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Podemos expressar o ângulo de $15^\circ$ como $45^\circ - 30^\circ$. Assim, uma vez que a tangente de $30^\circ$ é
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||
$\frac{\sqrt{3}}{3}$ e a tangente de $45^\circ$ é $1$, temos,
|
||
utilizando a equação ([-@eq-tgdif]),
|
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$$
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||
\begin{aligned}
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||
\tg(15^\circ) &= \tg(45^\circ - 30^\circ) \\[10pt]
|
||
&= \frac{1 -\frac{\sqrt{3}}{3}}{1 + 1 \cdot \frac{\sqrt{3}}{3}} \\[10pt]
|
||
&= \frac{\frac{3 - \sqrt{3}}{3}}{\frac{3 + \sqrt{3}}{3}} \\[10pt]
|
||
&= \frac{3 - \sqrt{3}}{3 + \sqrt{3}}
|
||
\end{aligned}
|
||
$$
|
||
|
||
Neste momento, podemos efetuar uma racionalização e encontrar
|
||
|
||
$$\begin{aligned} \tg(15^\circ) &= \frac{3 - \sqrt{3}}{3 + \sqrt{3}}\cdot \frac{3 + \sqrt{3}}{3 + \sqrt{3}} \\[10pt]
|
||
&= \frac{12 - 6\sqrt{3}}{6} = 2 - \sqrt{3} \\[10pt]
|
||
& \approx 0,2679 \end{aligned}$$
|
||
|
||
Assim $h = 0,2679 \cdot2,60 = 0,6965 \thinspace m$.
|
||
|
||
Para sabermos a altura da porta, basta somarmos o valor encontrado com a
|
||
altura do observador $(1,60 \thinspace m)$, deste modo a altura da
|
||
porta é $2,2965 \thinspace m$.
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||
|
||
Cabe ressaltar que a altura da porta obtida pela medição convencional,
|
||
isto é, medindo a porta como uma trena é de $2,30 \thinspace m$.
|
||
Logo, podemos notar que a medida obtida utilizando o astrolábio fornece
|
||
um resultado muito próximo a altura real da porta, sendo que a diferença
|
||
obtida se deve às aproximações realizadas e a possíveis imprecisões nas
|
||
medições.
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||
|
||
Podemos aproveitar o contexto gerado pelo experimento para explorar o
|
||
seno, cosseno ou tangente de arcos e as relações entre seno, cosseno e
|
||
tangente da soma, ou diferença, dos respectivos arcos, tais como as
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||
apresentadas na Tabela 1.
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||
Tabela 1 -- Relações entre seno, cosseno e tangente da soma e/ou
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diferença de arcos e os respectivos arcos
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|:---:|
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| $\sen(a + b) = \sen a \cdot \cos b + \sen b \cdot \cos a$ |
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||
| $\sen(a - b) = \sen a \cdot \cos b - \sen b \cdot \cos a$ |
|
||
| $\cos(a + b) = \cos a \cdot \cos b - \sen a \cdot \sen b$ |
|
||
| $\cos(a - b) = \cos a \cdot \cos b + \sen a \cdot \sen b$ |
|
||
| $\tg(a + b) = \frac{\tg a + \tg b}{1 - \tg a \cdot \tg b}$ |
|
||
| $\tg(a - b) = \frac{\tg a - \tg b}{1 + \tg a \cdot \tg b}$ |
|
||
|
||
Podemos, ainda, explorar os conceitos de racionalização, bem como de
|
||
valor aproximado (arredondamento), números racionais e irracionais.
|
||
|
||
### Medindo um prédio
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||
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::: bloco-imagem
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||
|
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{#fig-412 fig-alt="Imagem ao ar livre com um gramado, um prédio, uma árvore e uma pessoa
|
||
usando o astrolábio caseiro para medir a altura do prédio. Sobre a
|
||
imagem há marcações em verde mostrando as medidas obtidas: os ângulos
|
||
alfa e teta, a altura do observador e a distância do observador até a
|
||
árvore. A altura do prédio desde a cabeça do observador até o topo é uma
|
||
linha pontilhada." loading="lazy"}
|
||
:::
|
||
|
||
O objetivo desse experimento foi criar uma situação diferente das
|
||
geradas nos dois casos anteriores. Neste caso o ângulo θ não é um ângulo
|
||
notável, tão pouco pode ser obtido por meio da soma ou subtração de
|
||
ângulos notáveis. Sendo assim, abordaremos a possibilidade de utilizar
|
||
planilhas eletrônicas. Escolhemos, para realizar o experimento, medir a
|
||
altura de um prédio. Como nos casos anteriores, foram medidos o ângulo α
|
||
com ajuda do astrolábio, a distância entre o observador e o prédio e a
|
||
altura do observador, como podemos ver na [@fig-412].
|
||
|
||
O ângulo marcado no transferidor foi $\alpha = 50 ^\circ$, porém,
|
||
devemos lembrar que este ângulo é o complementar do ângulo formado pela
|
||
linha de visão do observador e o solo. Assim, o ângulo entre a linha de
|
||
visão do observador e o solo é $\theta = 40 ^\circ$. Temos também
|
||
que a distância entre o observador e o objeto é $ d = 13,50 \thinspace
|
||
m $ e que a altura do observador é $ h = 1,80 \thinspace m $.
|
||
|
||
Quando voltarmos para a sala de aula e utilizar os resultados das
|
||
medições, observaremos que neste experimento, o ângulo encontrado não é
|
||
um ângulo notável e não conseguimos obtê-lo a partir da soma ou
|
||
diferença de ângulos notáveis. Portanto, exploraremos o uso de
|
||
calculadora ou planilhas eletrônicas como, por exemplo, o Excel (2020),
|
||
para o cálculo de valores das funções trigonométricas. O Excel
|
||
disponibiliza as funções *sen, cos* e *tan*, que fornecem,
|
||
respectivamente o seno, o cosseno e a tangente de um ângulo dado em
|
||
radianos. Neste momento cabe abordar a questão das diferentes unidades
|
||
de medida que podem ser utilizadas para medir ângulos e a relação entre
|
||
elas. Nas calculadoras científicas, por exemplo, devemos escolher qual
|
||
unidade de medida (radianos, grau ou grado) vamos utilizar. No Excel,
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por exemplo, se digitarmos "$\sen(30)$"", o aplicativo irá retornar o
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valor -0,98803. O leitor distraído pode achar que o software realizou um
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cálculo errado, pois sabe que seno de $30^\circ$ é $0,5$. O
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acontece é que o Excel entende o argumento "$30$"" como $30$
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radianos, que equivale aproximadamente $1719^\circ$, que é um arco
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situado no quarto quadrante.
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Assim, se optamos por utilizar o Excel e desejamos retornar o valor do
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seno (cosseno, tangente) de um ângulo dado em graus, devemos primeiro
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transformá-lo em radianos, utilizando a função *radianos*. Por exemplo,
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para calcular o seno de $30^\circ$, podemos digitar no Excel $\sen(\text{radianos}(30))$ e então o Excel retornará o valor $0,5$.
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Retornando ao nosso problema, podemos utilizar a função para encontrar
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$\tg 40^\circ = 0,8391$.
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Assim, utilizando a relação ([-@eq-tg]), obtemos
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$$h = 0,8391 \cdot 13,50 = 11,33 \thinspace m$$.
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Para sabermos o valor da altura do prédio, basta somarmos $h$ com a altura do observador, obtendo que a altura do prédio é $13,12 \thinspace m$.
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Destacamos que por ocasião deste experimento, o professor, em sala de
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aula, além de explorar a utilização de planilhas eletrônicas como
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ferramenta para o ensino, neste caso da trigonometria, pode explorar a
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relação entre as unidades de medida de ângulo, grau e radianos, o sinal
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das funções seno, cosseno e tangente em cada um dos quadrantes e o
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(de)crescimento dessas funções trigonométricas, de modo que, o aluno,
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conhecendo os valores dessas funções para os ângulos notáveis, possa
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avaliar a coerência da resposta retornada pelo software.
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## Considerações finais
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Acredita-se que as atividades apresentadas nesta proposta didática
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permitirão a utilização de aspectos da história da matemática para
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ensinar conceitos de trigonometria, corroborando com a opinião de
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diversos autores de que ao utilizar a história da matemática como
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ferramenta didática, estamos proporcionando mais do que um recurso
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informativo. Essa metodologia permite mostrar aos alunos uma matemática
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em construção, portanto fruto da invenção humana. Permitirá ainda uma
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abordagem diferente para o conteúdo de trigonometria, com as atividades
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práticas, possibilitando a percepção de que a trigonometria pode ser
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utilizada em atividades cotidianas. Por último, a proposta didática
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estimula e exemplifica a utilização de planilhas eletrônicas em sala de
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aula. Essa prática, além de colocar os alunos em contato com uma
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ferramenta muito presente na vida cotidiana, permite que os alunos
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desenvolvam os cálculos mais rapidamente, podendo dar maior atenção às
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ideias e conceitos presentes na atividade.
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## Notas
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1. ::: {#footnote-23}
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Acadêmica do Curso de Matemática -- Unioeste/Cascavel-PR. Bolsista
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do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid).
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E-mail: bruna.unser@unioeste.br [↑](#footnote-ref-23)
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:::
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2. ::: {#footnote-24}
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Acadêmico do Curso de Matemática -- Unioeste/Cascavel-PR. Bolsista
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||
do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid).
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||
E-mail: Eduardo.zeni1@unioeste.br [↑](#footnote-ref-24)
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:::
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3. ::: {#footnote-25}
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Professora do Curso de Matemática -- Unioeste/Cascavel. Colaboradora
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de área do subprojeto Interdisciplinar Matemática/Química, do
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||
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (Pibid), da
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||
Unioeste. E-mail: <fabiana.papani@unioeste.br> [↑](#footnote-ref-25)
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:::
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4. ::: {#footnote-26}
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||
"Cientistas" e "Ciências" estão sendo usadas em um sentido amplo
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neste texto. Questionamentos como "Existia ciência na antiguidade?"
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não fazem parte do escopo deste trabalho. [↑](#footnote-ref-26)
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## Referências |